DOUTRINA COMENTADA - Crime de Rachadinhas e Funcionários Fantasmas - Várias Hipóteses - Desde Crime de Peculato-Desvio, Peculato-Apropriação, Peculato-Furto, Extorsão Até Concussão. - Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe
No momento, você está visualizando DOUTRINA COMENTADA – Crime de Rachadinhas e Funcionários Fantasmas – Várias Hipóteses – Desde Crime de Peculato-Desvio, Peculato-Apropriação, Peculato-Furto, Extorsão Até Concussão.

DOUTRINA COMENTADA – Crime de Rachadinhas e Funcionários Fantasmas – Várias Hipóteses – Desde Crime de Peculato-Desvio, Peculato-Apropriação, Peculato-Furto, Extorsão Até Concussão.

Olá, pessoal!

 

 

Um assunto que atormenta e que provoca controvérsia doutrinária e jurisprudencial diz respeito aos crime praticados por parlamentares, na esfera federal, estadual e municipal.

Discute-se em sede doutrinária e jurisprudencial quais são os crimes praticados por parlamentares envolvidos com o esquema fraudulento conhecido por “Rachadinha” e “Funcionários Fantasmas”.

Dependendo das circunstâncias, podem surgir os crimes de Peculato-Apropriação, Peculato-Desvio, Peculato-Furto, Corrupação Passiva, Extorsão, Concussão, Lavagem de Dinheiro, Associação Criminosa e outros.

Inicialmente, irei fazer um explanação em relação  às espécies de Crime de Peculato, in verbis:

 

O Código Penal no seu artigo 312, caput e em seu § 1º, prevê 03(três) figuras criminosas denominadas de Peculato-Apropriação, Peculato-Desvio e Peculato-Furto.

 

Art. 312 – Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo (Peculato-Apropriação, grifo nosso), ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio (Peculato-Desvio, grifo nosso):

Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa.

§ 1º – Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário (Peculato-Desvio e Peculato-Furto, grifo nosso).

 

 

São elementos comuns aos 03(três) crimes:

 

a) qualidade de funcionário público do sujeito ativo;

b) necessidade de que o objeto material seja um bem móvel, tal como dinheiro ou valor, público ou particular, E não necessariamente apenas bem infungível;

(c) que haja relação entre o cargo e a possibilidade de acesso ao bem móvel. Ou seja, no caso de Peculato-Apropriação e Peculato-Desvio, a POSSE da coisa pelo agente público deu-se em razão do cargo. A posse da coisa móvel pelo agente público ocorreu de forma LÍCITA.

A qualidade de funcionário é essencial  nos 03(três) crimes em análise, mormente quando um terceiro, que não reúne a qualidade de funcionário público, concorre para a prática do crime, seja como coautor ou partícipe.

Obviamente, a colaboração de terceiro na empreitada criminosa fará com responda pelo Crime de Peculato, em qualquer de suas formas, com fundamento no Art. 30, do Código Penal.

Ressaltando que o terceiro tenha agido dolosamente e que tenha ciência de colabora com o funcionário na empreitada criminosa para que possa responder penalmente pelo Crime de Peculato. 

 

 

Funcionário público

Art. 327 – Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

§ 1º – Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.  

§ 2º – A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.

 

 

Circunstâncias incomunicáveis

Art. 30 – Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.

 

 

Elemento Subjetivo do Tipo

 

Apropriar-se

 

Segundo a doutrina, importa em assenhoramento da coisa móvel (no todo ou
em parte). Tornar-se dono,  fazê-la própria, dispondo-a como seu proprietário. Consuma-se quando o agente público inverte o título da posse, passando a reter a coisa a título de uti dominus. Urge ressaltar que somente se evidencia tal comportamento através de circunstâncias decorrentes de atos exteriores de utilização do bem. A título de exemplo: retenção, alienação, especificação, consumo, etc.  Para a caracterização, o funcionário público deve receber a coisa de maneira lícita, em razão do cargo, mas que, posteriormente, passa a comportar-se como se fosse o seu dono.

A coisa móvel (dinheiro, por exemplo) já deve estar na posse do funcionário público, consumando-se o crime de PECULATO-APROPRIAÇÃO quando há mudança no elemento subjetivo, recusando-se a restituir ou consumindo-a.

 

Desviar

 

Por esse elemento subjetivo do tipo, o funcionário público, o parlamentar, dá a coisa móvel (dinheiro) destinação diversa que havia sido prevista por lei. Tem o significado de dar encaminhamento ou aplicação diversa da que foi estabelecida pela Administração. O agente público beneficia-se a si a terceiro dando destinação diversa da coisa móvel que previamente tinha a Posse Lícita.

Informo, ainda, que a destinação de coisa móvel (dinheiro) deve ocorrer em proveito próprio ou alheio, nunca em benefício da Administração, sob pena de vir a ocorrer o crime de Desvio de Verba Pública.

 

Uso Momentâneo de Coisa Infungível

 

Neste tópico, cuidado para o Peculato de Uso, que, de acordo com a jurisprudência e doutrina, constitui-se de FATO ATÍPICO, mas poderá caracterizar um Ilícito Administrativo.

 

Neste sentido, Ferando Capez, in verbis:

 

Caso o funcionário apenas use momentaneamente um bem da Administração Pública (por exemplo: utilize automóvel da Prefeitura para ir a uma festa particular) e o devolva no mesmo estado e no local em que o retirou, similarmente ao que ocorre no crime de furto e apropriação indébita, o uso no caso é fato atípico, pois não há a intenção de o funcionário ter a coisa para si (animus domini).

 

Peculato e Gasolina de automóvel da Administração Pública.

 

Contudo, quanto à gasolina fornecida pela Administração Pública, seu consumo poderá tipificar o peculato.

 

Agora, vamos tecer comentários às hipóteses fáticas que comumente ocorre em todo o Brasil!

 

Primeia Hipótese

 

 

Inicialmente, há a hipótese em que o ocupante em cargo comissionado tem pleno conhecimento dos fatos ardilosos perpetrados pelo parlamentar, aceita, participa, e recebe o salário decorrente do cargo comissionado para o qual foi nomeado, mas não exerce a função, mas sim presta serviços de natureza particular para empresa de que o parlamentar é titular na qualidade de sócio.

Neste caso, o servidor nomeado não repassa parte de sua remuneração para o parlamentar, mas presta serviços para empresa de que ele proprietário, em vez de laborar para a Administração Pública. 

 

Diante deste cenário qual o tipo penal praticado pelo parlamentar e o terceiro?

 

Primeiro Entendimento

Trata-se de Crime de Peculato-Desvio – Art. 312, caput, segunda parte, do Código Penal.

 

Para esta corrente doutrinária, o Agente Político comete o Crime de Peculato-Desvio, Art. 312, caput, segunda parte, do Código Penal, na medida em desviou recursos públicos em relação aos quais possuía posse lícita prévia para remunerar seu funcionário particular, o qual exercia seu labor em empresa privada de sua propriedade.

O fundamento para esta posição doutrinária reside no fato de o parlamentar possuía, previamente, a posse lícita de verba de gabinete destinada para remuneração de seus assessores parlamentares.

Houve desvio de destinação de verba de gabinete que deveria ter sido usada para remunerar aqueles que lá trabalham. In casu, terceiro exerce seu labor de natureza privada para o parlamente, cuja remuneração é paga com a verba de gabinete. Na verdade, a remuneração (dinheiro, bem fungível) paga ao terceiro é o objeto material do crime de peculato.

Importante destacar o sentido que se deve dar ao termo POSSE.

Segundo a doutrina, a POSSE não é só aquela decorrente de mera detenção da coisa pública (Posse Imediata) como também aquele que ser perfaz com o Poder de Disposição Jurídica sobre o valor monetário (Posse Mediata).

Neste cenário, vislumbra-se que o Parlamentar  tem a posse lícita de valores, disponibilizados pela Câmara dos Deputados, a título de exemplo, para pagamento de suas despesas de gabinete, cuja afetação é destinada à remuneração de seus servidores que trabalham em seu Gabinete.

Observa-se que o Parlamentar tem o poder de dispor desse valor como bem lhe aprouver, mas com destinação vinculada ao pagamento de remuneração de seus servidores ou outra despesa de gabinete, em troca do serviço prestado ao Poder Público.

 

Em certa oportunidade, o Supremo Tribunal Federal afirmou, in verbis:

 

Com efeito, a imputação contida na denúncia diz respeito ao desvio de valores do erário, ao admitir e manter determinada pessoa como assessora parlamentar, quando de fato tal pessoa exercia atividades laborativas para a sociedade empresária titularizada pelo denunciado.

Na realidade, a conduta narrada consistiu no desvio de valores pecuniários (dinheiro) de que o denunciado tinha a posse (prévia, grifo nosso) em proveito alheio (da pessoa que passou a ocupar, formalmente, as funções de assessora parlamentar). 

 

 

Em resumo, diríamos:

 

O Agente Público (Parlamentar), em um primeiro momento, possui a Posse Mediata da Coisa, de forma LÍCITA, pois tem a disponibilidade jurídica dos valores que lhe foram disponibilizados pelo Parlamento (Câmara dos Deputados, por exemplo), e, num segundo momento, dá destinação diversa daquela prevista pelo ordenamento jurídico, no sentido de que tais valores devem possuir destinação, dentre muitas, para remunerar servidor em troca dos serviços prestados ao Poder Público, ou seja, remunerar servidores que exercem cargo comissionado que efetivamente prestem os serviços para os quais foram nomeados.

Assim, o valor pecuniário (dinheiro) é entregue ao Parlamentar, o qual possui a posse lícita e prévia, e, em seguida, inverte o título da posse, dando-lhe destinação diversa da determinada por lei, desviando-a, praticando, portanto, o Crime de Peculato-Desvio.

 

Segundo Entendimento

Trata-se de Crime de Peculato-FurtoArt. 312, parágrafo 1º, do Código Penal.

No entanto, sustenta esta corrente o entendimento de que se trata do Crime de Peculato-Furto, pois o Parlamentar, que assim age, utiliza-se de um ardil, engodo visando subtrair valor monetário do Poder Público para custear o trabalho despendido por terceiro em benefício particular, incidindo, portanto, nas penas do Art. 312, parágrafo 1º, do Código Penal.

O Parlamentar, mediante ardil, subtrai valores do Poder Público, para pagamento de remuneração de servidora, em troca de seu labor, que no caso inexiste. O Agente Público subtrai valores da esfera de disponibilidade e vigilância da vítima, ora administração pública, mediante fraude, sob a justificativa de que seria utilizada para pagar a remuneração pelos serviços públicos prestados pela servidora nomeada para o cargo em comissão.

A se admitir este raciocínio, é de supor que o Parlamento em nenhum momento entregou quantia alguma para o Parlamentar, para pagamento de despesas de gabinete. Neste caso, o Parlamentar não teve a Posse Lícita de quantia para pagamento de despesas de gabinete.

 

§ 1º – Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário (Peculato-Furto, grifo nosso).

 

Por outro lado, trago à baila o entendimento da doutrina, minoritária, de que, na verdade, consubstancia Peculato de Uso, resultando em Atipicidade da conduta do parlamentar.

 

Segunda Hipótese

 

Por outro lado, há a hipótese em que o ocupante em cargo comissionado tem pleno conhecimento dos fatos ardilosos perpetrados pelo parlamentar, aceita e participa, ficando com parte do salário, e repassando restante para ele.

Neste caso, o servidor comissionado recebeu parte de seu salário e não retribui, em contrapartida, com o seu trabalho.

É o famoso caso do “Funcionárion Fantasma”.

 

Segundo jurisprudência, ambos, o servidor comissionado e o parlamentar, cometeram Peculato-Apropriação, por ficarem com dinheiro sem que houvesse a contrapartida mediante trabalho.

É o famoso caso do “Funcionário Fantasma”.

Segundo jurisprudência, ambos, o servidor comissionado e o parlamentar, cometeram Peculato-Apropriação, por ficarem com dinheiro sem que houvesse a contrapartida mediante trabalho.

 

 

Terceira Hipótese

 

O subordinado, antes de ser nomeado para o cargo comissionado, e, por conseguinte, contratado pelo Poder Público (pela Assembleia Legislativa, por exemplo) aceita, como condição para tal, repassar metade de seus proventos para o parlamentar, Deputado Estadual, por exemplo.

O ocupante do cargo comissionado, uma vez nomeado e empossado, entrega ao final do mês parte de seu salário para o deputado estadual. Isto ocorre, porque há uma premente ameaça de ser exonerado do cargo comissionado, em relação ao qual aceitou exercer e repassar parte do seu salário ao parlamentar.

 

Vejam, que neste caso, o acordo foi entabulado previamente, antes da nomeação e posse no cargo comissionado. In casu, o Parlamentar exigiu parte do salário do comissionado para si como condição para a contratação futura. Por se tratar de dinheiro público, ocorre o Crime de Peculato-Desvio.

Nesta hipótese, há discussão se teria ocorrido os crimes de Corrupção Passiva ou Peculato-Desvio.

Entendo tratar-se de Peculato-Desvio.

 

Quarta Hipótese

 

Pode ocorrer, também, a situação em que inicialmente não houve acordo algum entre o parlamentar e o ocupante de cargo comissionado. Porém, posteriormente, ocorre a exigência de repasse de parte de seu salário, por parte do parlamentar, sob condição de sua permanência em cargo comissionado. Aqui há indubitavelmente a ocorrência do Crime de Concurssão.

 

O que diz o tipo penal do Art. 316, do Código Penal, in verbis: 

 

Concussão

Art. 316 – Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.  

Segundo a doutrina, o sujeito ativo é funcionário público, que exige vantagem (seja qual for a sua natureza, econômica ou não) em razão do exercício da função pública. A vítima cede a exigência do funcionário público por temer represálias relacionadas ao exercício de sua atividade.

In casu, o Parlamentar se vale de sua autoridade que decorre da função pública exercida para incutir temor na vítima, visando obter vantagens econômicas indevidas. 

Se o servidor contratado ou ocupante de cargo em comissão não ceder a exigência do Parlamentar consistente em entregar parte de sua remuneração, mensalmente, inevitavelmente acarretará a sua exoneração ou rescisão do seu contrato de trabalho. 

O crime de concussão poderá ocorrer, inclusive, antes de sua nomeação para o cargo em comissão no Parlamento. Neste caso, o Parlamentar constrange o futuro servidor comissionado a aceitar a proposta sob pena de não vir a ser nomeado, caso não aceite. 

Importe ressaltar que, por ser Delito Formal, tem-se por consumado o crime com a simples exigência, constrangimento em aceitar a proposta, ainda que não venha, no futuro, a entregar parte de sua remuneração. 

 

Quinta Hipótese

 

Nesta hipótese, o cidadão é nomeado para o cargo comissionado, mas não tem conhecimento de que o fora.

O salário (dinheiro público) que deveria ser entregue para o ocupante de cargo comissionado é desviado pelo parlamentar, que se aproveita, ora sacando na boca do caixa (banco), ora fazendo transferência bancária.

 

O cidadão como não tem ciência e participação de fato algum envolvendo a sua pessoa, é vítima mediata.

Aqui, poderá estar configurado os crimes de Falsidade Material, Peculato-Apropriação e Falsidade Ideológica.

 

 

Veja também comentários doutrinários dos eminetes Doutores, in verbis:

 

César Dario Mariano da Silva – Procurador de Justiça – Ministério Público de São Paulo

 

Rachadinha” e o Direito Penal – Crime ou Fato Atípico? Por Bruno Gilaberte, Delegado de Polícia.

 

 

Assistam aos vídeos sobre o tema “Rachadinhas e Funcionários Fantasmas”, in verbis:

 

 

 

 

 

 

 

Por ora é isso, Pessoal!

Bons Estudos!

 

Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe

O Delegado Ronaldo Entringe é um estudioso na área de preparação para Concursos Públicos - Carreiras Policiais, e certamente irá auxiliá-lo em sua jornada até a aprovação, vencendo os percalços que irão surgir nesta cruzada, sobretudo através do planejamento estratégico das matérias mais recorrentes do certame e o acompanhamento personalizado.

Deixe um comentário