Vamos tratar das diversas espécies de Dolo!
a) Dolo Natural: é aquele que não contém qualquer juízo de valor. Nele está inserido apenas a consciência e vontade em realizar as elementares do tipo penal, desprovido, portanto qualquer juízo de valor, isto é, não se perquire aqui se o agente agiu dotado de compreensão quanto ao certo ou errado, justo ou injusto, ilícito ou não. Esses valores serão visto no estudo da Potencial Consciência da Ilicitude, no exame da Culpabilidade.
Segundo Capez, in verbis:
Foi concebido pela Doutrina Finalista, integra a conduta e, por conseguinte, o fato típico.
Não é elemento da culpabilidade, nem tem a consciência da ilicitude como seu componente.
b) Dolo Normativo: Não tem qualquer relevância teórica ou prática atualmente.
Era o dolo previsto pela Teoria Naturalista ou Causal.
Para essa teoria o dolo era, além de psicológico, normativo. Psicológico porque continha a consciência e vontade de realizar as elementares do tipo penal. Normativo porque era dotado de Potencial Consciência da Ilicitude, isto é, a possibilidade de o agente entender que sua conduta era ilícita, injusta e errada.
Psicológico: Consciência e Vontade.
Normativo: Potencial Consciência da Ilicitude.
O Dolo Normativo compunha a Culpabilidade, constituindo-se de:
1) consciência e vontade e
3) consciência da ilicitude.
Com a chegada da Teoria Finalista, a consciência e vontade foram retiradas da Culpabilidade e passou a integrar a conduta, permanecendo apenas a consciência da ilicitude na Culpabilidade, compondo com a Inexigibilidade de Conduta Diversa e a Imputabilidade os seus requisitos.
Ainda, Capez, in verbis:
Só há dolo quando, além da consciência e da vontade de praticar a conduta, o agente tenha consciência de que está cometendo algo censurável (Potencial Conhecimento da Ilicitude, grifo nosso).
O dolo normativo, portanto, não é um simples querer, mas um
querer algo errado, ilícito (Dolus Malus).Deixa de ser um elemento puramente psicológico (um simples querer), para ser um fenômeno normativo, que exige juízo de valoração (um querer algo errado).
Dolo é um fenômeno puramente psicológico, cuja existência depende de mera constatação, sem apreciações valorativas (ou o agente quer ou não).
A consciência da ilicitude não é componente do dolo, mas elemento autônomo que integra a culpabilidade.
Em suma, o dolo é formado apenas por consciência e vontade, sendo um fenômeno puramente psicológico, e pertence à conduta, devendo ser analisado desde logo, quando da aferição do fato típico.
Prosseguindo:
c) Dolo Direto ou Determinado: é aquele em que o agente, agindo com consciência e vontade, quer o resultado pretendido. Basta um querer.
d) Dolo Indireto ou Indeterminado: Por sua vez, o agente não quer, não deseja diretamente o resultado, mas aceita a possibilidade de vir a ocorrer. O agente age por Dolo Eventual ou por Dolo Alternativo.
Exemplos extraído do Livro de Fernando Capez, in verbis:
Dolo Alternativo: “quando o agente deseja qualquer um dos eventos possíveis.
Por exemplo: a namorada ciumenta surpreende seu amado conversando com a outra e, revoltada, joga uma granada no casal, querendo matá-los ou feri-los. Ela quer produzir um resultado e não ‘o’ resultado.
No Dolo Eventual, conforme já dissemos, o sujeito prevê o resultado e, embora não o queira propriamente atingi-lo, pouco se importa com a sua ocorrência (‘eu não quero, mas se acontecer, para mim tudo bem, não é por causa deste risco que vou parar de praticar minha conduta — não quero, mas também não me importo com a sua ocorrência’).
É o caso do motorista que se conduz em velocidade incompatível com o local e realizando manobras arriscadas. .
Mesmo prevendo que pode perder o controle do veículo, atropelar e matar alguém, não se importa, pois é melhor correr este risco, do que interromper o prazer de dirigir (não quero, mas se acontecer, tanto faz).
Outros Exemplos:
São também casos de dolo eventual:
praticar roleta-russa, acionando por vezes o revólver carregado com um cartucho só e apontando-o sucessivamente contra outras pessoas, para testar sua sorte, e
participar de inaceitável disputa automobilística realizada em via pública (“racha”),
ocasionando morte.
e) Dolo Genérico: é aquele em que o agente realiza as elementares do tipo penal sem especial fim de agir. Não há qualquer finalidade como requisito para realizar o tipo penal. Por exemplo, no crime de homicídio, caput do Art. 121, do Código Penal, não há fim algum, bastar ceifar a vida humana.
Exemplo, segundo Capez, in verbis:
no tipo do homicídio, basta a simples vontade de matar alguém para
que a ação seja típica, pois não é exigida nenhuma finalidade
especial do agente (o tipo não tem elemento subjetivo).
f) Dolo Específico: Diversamente do Dolo Genérico, aqui o agente adota um comportamento visando um fim específico como requisito do tipo penal, ou seja, para haver correspondência entre a conduta e o tipo penal faz-se necessário a presença do elemento subjetivo do tipo penal.
Exemplo: no crime de extorsão mediante sequestro, não basta a simples vontade de sequestrar a vítima, sendo também necessária a sua finalidade
especial de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como
condição ou preço do resgate, porque esse fim específico é exigido. Autor Fernando Capez!O crime exige (1) a vontade de sequestrar alguém + (2) a finalidade especial de exigir vantagem.
Só a vontade de realizar o verbo do tipo será insuficiente, sendo
imprescindível o fim de obtenção de vantagem, como condição ou
preço do resgate.No furto, do mesmo modo, não basta a vontade de subtrair, sendo necessário o ânimo de assenhoreamento definitivo (subtrair + para si, isto é, para ficar com o bem, ou para outrem, ou seja, para entregá-lo a terceiro).
É, justamente, em razão desse elemento subjetivo que o furto de uso (subtrair + para uso momentâneo) constitui fato atípico.
i) Dolo Geral, Erro Sucessivo ou “Aberratio Causae”: Nesta espécie de dolo, o agente inicialmente pratica uma conduta que, imagina já ter-se consumado. Mas em seguida, pratica outra conduta, por considerar mero exaurimento. É nesse momento seguinte que ocorre a consumação do crime.
Exemplo, extraído do Livro de Fernando Capez, in verbis:
Um perverso genro, logo após envenenar sua sogra, acreditando-a morta, joga-a, o que supunha ser um cadáver, nas profundezas do mar.
A vítima, no entanto, ainda se encontrava viva, ao contrário do que imaginava o autor, vindo, por conseguinte, a morrer afogada.
Operou-se um equívoco sobre o nexo causal, pois o autor pensava tê-la matado por envenenamento, mas na verdade acabou, acidentalmente, matando-a por afogamento.
No momento em que imaginava estar simplesmente ocultando um cadáver, atingia a consumação.
…
O dolo é geral e abrange toda a situação, até a consumação, devendo o sujeito ser responsabilizado por homicídio doloso consumado, desprezando-se o erro incidente sobre o nexo causal, por se tratar de um erro meramente acidental.
Luiz Flávio Gomes assim se manifesta sobre o tema:
“responde por crime de homicídio doloso o agente que, desejando matar a vítima por afogamento, joga-a do alto da ponte, porém esta vem a morrer por fratura no crânio provocada pelo impacto com um pilar da ponte.
Também se fala em aberratio causae, quando o fato se consuma em dois atos (sobre duas condutas, grifo nosso), sobre cuja significação se equivoca o autor, ao crer que o resultado se produzira já em razão do primeiro ato, quando, na verdade, ele vem a acontecer pelo segundo, destinado a ocultar o primeiro.
Depois de estrangular a vítima, o autor, crendo que ela está morta, enforca-a para simular um suicídio, todavia fica comprovado que a vítima na verdade morreu em razão do enforcamento. Responde por um só homicídio doloso consumado”.
Um exemplo interessante extraído do Livro de Fernando Capez que pode ser objeto de uma prova discursiva ou objetiva. veja:
Outro interessante exemplo é o do sujeito que, pretendendo eliminar a vítima, ministra veneno em sua bebida; no entanto, por equívoco, em vez de veneno coloca açúcar, meio ineficaz para matar uma pessoa normal.
A vítima, no entanto, é diabética e vem a falecer.
E agora, qual a solução?
Novamente, a resposta àquelas duas indagações nos ajuda:
o autor quis matar? Sim.
E acabou matando? Sim.
Então, responde por homicídio doloso consumado.
É certo que ele errou na causa, mas tal erro revelou-se irrelevante, pois de um jeito ou de outro ele produziu o resultado pretendido.
Mas o meio não era ineficaz? Não, tanto que a vítima morreu.
Poder-se-ia objetar que o agente não sabia que a vítima era diabética, porém tal desconhecimento é irrelevante, pois o que interessa é que ele quis o resultado e agiu para produzi-lo.
Daí por que o erro sobre o nexo causal (aberratio causae) é irrelevante. Não elimina o dolo, nem o resultado.
j) Dolo de Primeiro Grau e de Segundo Grau:
O Dolo de Primeiro Grau é aquele em que o agente, mediante uma conduta consciente e voluntária, obtém o resultado almejado desde o início. A morte de um jogador de futebol famoso que está no avião.
Por sua vez, o Dolo de Segundo Grau ou Dolo de Consequência Necessária nada mais é do que os Efeitos Colaterais decorrente do Dolo de Primeiro Grau. A morte dos demais passageiros do avião são efeitos necessários para atingir a morte do jogador de futebol famoso.
O resultado em relação ao Dolo de Segundo Grau é necessário para a consecução do Dolo de Primeiro Grau, ou seja, a morte do jogador de futebol famoso.
Difere do Dolo Eventual, pois o resultado não querido, mas previsto é aceito como a possível de vir a ocorrer ou não.
… ao passo que o de segundo grau abrange os efeitos colaterais da prática delituosa, ou seja, as suas consequências secundárias, que não são desejadas originalmente, mas acabam sendo provocadas porque indestacáveis do primeiro evento.
Para Luiz Flávio Gomes, in verbis:
Dolo de Primeiro Grau é o dolo direto (o agente prevê determinado resultado, dirigindo sua conduta na busca de realizar esse mesmo resultado).
O Dolo de Segundo Grau ou Dolo de Consequência Necessária, por sua vez, configura-se quando o agente produz resultado paralelo ao visado, pois necessário à realização deste.
Vejamos um exemplo de Rogério Greco: quero matar meu desafeto que está no avião, para tanto, coloco uma bomba no avião que, ao explodir, vai matar meu desafeto e todo mundo que estiver lá dentro.
Com relação ao meu desafeto, agi com dolo de primeiro grau; com relação aos demais passageiros, eu agi com dolo de segundo grau.
A morte dos demais passageiros é o resultado paralelo necessário para eu alcançar a minha primeira necessidade, que é a morte do meu desafeto.
Também difere do Dolo Direto de Segundo Grau porque, embora neste também haja uma representação do agente sobre as consequências do meio escolhido para alcançar o objetivo principal, no Dolo Eventual a indiferença e a representação recaem sobre o “objetivo” principal, e não nas consequências.
A eminente Doutrinadora Patrícia Hissa, afirma:
Já no dolo direto de 2º grau (ou dolo de consequência necessária), o agente delituoso sabe, tem consciência de que para atingir um resultado previamente pretendido, ele acabará e precisará a atingir outros resultados delimitados, mas que não lhe era pretendido previamente.
Quanto ao dolo eventual, tem-se quando o agente delituoso não deseja o resultado, mas não se preocupa caso ele aconteça. Não há vontade prévia do resultado.
A sua conduta é realizada por uma assunção exacerbada de risco. Exemplo: roleta russa em sinal de trânsito. Nesse tipo de dolo, o agente não é capaz de delimitar as consequências da sua conduta.