POLÍCIAS EM DESTAQUE - CRIME DE PRECONCEITO RACIAL e LESÃO CORPORAL - Caso Victor Meyniel - Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe
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POLÍCIAS EM DESTAQUE – CRIME DE PRECONCEITO RACIAL e LESÃO CORPORAL – Caso Victor Meyniel

Hodiernamente, é comum agressões físicas e verbais em face de pessoas por conta de sua opção sexual, o que tem gerando indignação por partes de Operadores do Direito e cidadãos, diante de tamanha barbárie.

Por outro lado, o Direito Penal não tem cumprido sua missão, dentre muitas, em inibir a prática de crimes de racismo, ou seja, não tem produzido o efeito desejado estabelecido pelo preceito secundário da norma penal. 

Lamentavelmente, ocorreu o crime de racismo praticado contra um ator, que repercutiu nas Redes Sociais e Mídias de Imprensa Eletrônica. 

Mas o que nos interessa nesse momento são os comentários à capitulação do fato realizada pelo Douto Delegado João Valentim, da 12ª Delegacia de Polícia de Copacabana, Rio de Janeiro, que disse em entrevista para o jornal O Globo, in verbis:

 

“É nítido que Yuri agrediu Meyniel por homofobia. Nenhum tipo de ato justifica uma agressão brutal daquela. Yuri se identificou como se fosse hétero. Ao passo que, agora sendo chancelado de homofóbico, ele se identifica como (sua sexualidade) aberta. Um negro pode ser racista e um gay homofóbico”, completou Valentim em entrevista para o jornal O Globo.

 

Apenas por amor ao debate doutrinário, contribuindo para enaltecer o trabalho investigativo do Delegado do Rio de Janeiro, e contribuir, de forma positiva, para que fatos como estes não se repitam, bem como, caso seja necessário, envidar esforços para uma mudança legislativa na seara penal visando, mormente, no aumento da reprimenda penal previsto no preceito secundário da norma penal, passamos a tecer comentários. 

Primeiramente, segundo consta dos veículos de imprensa eletrônica, o ator Victor Meyniel foi agredido fisicamente por sua opção sexual pelo nacional Yuri de Moura Alexandre, estudante de medicina, no dia 02.09.2023, por volta das 08:00 horas da manhã de sábado, em Copacabana, bairro da Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro, no saguão do prédio onde o agressor reside. Preso em flagrante delito no mesmo dia após retornar da academia. Consta do que foi apurado, que Victor Meyniel saiu da casa noturna Fosfobox em Copacabana em companhia de Yuri em direção ao apartamento deste.

No vídeo do saguão do prédio, obtido pela polícia civil, consta Yuri agredindo fisicamente, com muitos socos a vítima, sendo tal fato presenciado pelo porteiro, Gilmar José Agostini, que nada fez para impedir a agressão ou mesmo após, deixou de solicitar socorro. Por sua conduta omissiva, responderá por omissão de socorro, segundo o entendimento do Delegado João Valentim

 

De acordo com o site Migalhas:

 

O estudante de medicina Yuri de Moura Alexandre, que agrediu o ator e humorista Victor Meyniel, teve a prisão em flagrante convertida para preventiva, nesta segunda-feira, 5. A decisão foi do juiz de Direito Bruno Rodrigues Pinto, da Central de Audiências de Custódia do TJ/RJ.

Yuri foi preso em flagrante acusado de homofobia e agressão, no último domingo, 3. Além disso, pode responder também por falsidade ideológica, porque se apresentou à polícia como militar da Marinha, sendo que é estudante de medicina.

Na audiência, Victor alegou que conheceu o acusado na porta em uma boate e que ambos foram embora para o apartamento do acusado. Após troca de beijos, a outra moradora do apartamento chegou ao local, o que, de acordo com a vítima, fez com o Yuri apresentasse um comportamento agressivo e nervoso. 

Logo após este fato, o estudante teria expulsado Meyniel do local, passando a tratá-lo mal na área comum do prédio, momento em que a vítima afirmou a Yuri que “ele não precisava tratá-lo mal, uma vez que eles já teriam se beijado”.

 

Do que foi apurado,  Yuri de Moura Alexandre responderá criminalmente perante a Justiça pelos crimes de Homofobia, Lesão Corporal Leve e Falsidade Ideológica, porque se apresentou à polícia como militar da Marinha, sendo que é apenas um estudante de medicina.

 

Injuria Racial

Art. 2º-A Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional.     (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena: reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.       (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Parágrafo único. A pena é aumentada de metade se o crime for cometido mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas. 

 

 

Lesão corporal

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

Lesão corporal de natureza grave

Parágrafo 1º Se resulta:

I – Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

II – perigo de vida;

III – debilidade permanente de membro, sentido ou função;

IV – aceleração de parto:

Pena – reclusão, de um a cinco anos.

Parágrafo 2° Se resulta:

I – Incapacidade permanente para o trabalho;

II – enfermidade incurável;

III perda ou inutilização do membro, sentido ou função;

IV – deformidade permanente;

V – aborto:

Pena – reclusão, de dois a oito anos.

 

 

Falsidade ideológica

Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.

Parágrafo único – Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.

Já em relação ao porteiro, senhor Gilmar José Agostini, responderá pelo crime de Omissão de Socorro, in verbis: 

 

Omissão de socorro

Art. 135 – Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública

 

Histórico Quanto ao Crime de Racismo e Injuria Qualificada pelo Preconceito

 

Em decisão de 2021, o Supremo Tribunal Federal externou entendimento de que se deve considerar como Crime de Racismo o previsto no preceito penal do Art. 140, parágrafo 3º, do Código Penal, antes da alteração legislativa pela Lei n.º 14.532, de 2023, ou seja, em consentâneo com o ditado pela norma constitucional do art. 5º, inciso  XLII, que prevê a Imprescritibilidade, apenas, in verbis: 

Na decisão do Supremo Tribunal Federal, no HC 154248, julgado em 28/10/2021, e publicado em 23/02/2022, não fez referência à inafiançabilidade, mas apenas quanto a sua imprescritibilidade. Assim, nessa época, o Crime de Injuria Qualificada pelo Preconceito, com a decisão do STF, era imprescritível

 

Supremo Tribunal Federal HC 154248 – Órgão julgador: Tribunal Pleno – Relator(a): Min. EDSON FACHIN – Julgamento: 28/10/2021 – Publicação: 23/02/2022

Ementa: HABEAS CORPUS. MATÉRIA CRIMINAL. INJÚRIA RACIAL (ART. 140, § 3º, DO CÓDIGO PENAL). ESPÉCIE DO GÊNERO RACISMO. IMPRESCRITIBILIDADE. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

1. Depreende-se das normas do texto constitucional, de compromissos internacionais e de julgados do Supremo Tribunal Federal o reconhecimento objetivo do racismo estrutural como dado da realidade brasileira ainda a ser superado por meio da soma de esforços do Poder Público e de todo o conjunto da sociedade.

2. O crime de injúria racial reúne todos os elementos necessários à sua caracterização como uma das espécies de racismo, seja diante da definição constante do voto condutor do julgamento do HC 82.424/RS, seja diante do conceito de discriminação racial previsto na Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial.

3. A simples distinção topológica entre os crimes previstos na Lei 7.716/1989 e o art. 140, § 3º, do Código Penal não tem o condão de fazer deste uma conduta delituosa diversa do racismo, até porque o rol previsto na legislação extravagante não é exaustivo.

4. Por ser espécie do gênero racismo, o crime de injúria racial é imprescritível.

5. Ordem de habeas corpus denegada.

 

 

Constituição Federal de 1988

Art. 5º, inciso XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

 

 

Injuria 

Art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

§ 1º – O juiz pode deixar de aplicar a pena:

I – quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;

II – no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

§ 2º – Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.

Injuria Racial

§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem:             (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)

§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:  (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Pena – reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)

§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a religião ou à condição de pessoa idosa ou com deficiência:  (Redação dada pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 14.532, de 2023).

 

 

Injuria Qualificada pelo Preconceito – Art. 140, parágrafo 3º, do Código Penal.

Antes da decisão do STF, qualquer ofensa a pessoa certa invocando aspectos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência responderia pelo crime de Injuria Qualificada pelo Preconceito, cuja pena previa reclusão de 01 (um) a 3(três) anos de reclusão.

No aspecto processual penal, dependia-se de representação para fins de início da persecução penal, além de estar sujeito à prescrição penal

Injuria Racial

Art. 140, § 3º, do Código Penal: Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:  (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Pena – reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)

 

Atualmente, toda essa discussão doutrinária perdeu sentido, pois com a Lei n.º Lei nº 14.532, de 2023, qualquer ofensa à pessoa certa invocando aspectos relacionados a raça, cor, etnia ou procedência nacional, deverá ser tratado com Crime de Racismo, com previsão no art. 2º-A, da Lei n.º 7.716/1989, in verbis, sendo portanto considerando imprescritível, inafiançável e de ação penal pública incondicionada, com fundamento no art. 5º, inciso XLII, da Constituição da República. 

 

Art. 2º-A – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional.

Pena: reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único. A pena é aumentada de metade se o crime for cometido mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas.

 

Ressalta-se que quando a ofensa for praticada com base em religião ou à condição de pessoa idosa ou com deficiência, visando ofender a honra de pessoa certa, necessário ainda se faz de representação do ofendido, por se tratar de Crime de Ação Penal Pública Condicionada à Representação e afiançável, não sendo considerado Crime de Racismo, pois tais elementares do tipo penal não fazem parte da Lei de Preconceito Racial, nos termos do Art. 2º-A, da Lei n.º 7.716/1989, tendo permanecido de fora da alteração legislativa. Mas, imprescritível, segundo entendimento do STF.

Abaixo, reportagens relatando o fato ocorrido com o ator Victor Meyniel agredido fisicamente por sua opção sexual pelo nacional Yuri de Moura Alexandre, in verbis:

 

 

 

 

 

 

Prosseguindo, mediante um única conduta, com base no Concurso Formal Impróprio, nos termos do Art. 70, 2ª parte, do Código Penal, irá responder pelo Crime de Lesão Corporal Simples, o caput do Art. 129, do Código Penal e pelo Crime do Art. 2-A, caput, da Lei n.º 7.716/89 – Crime de Preconceito Racial, salvo entendimento diverso do ilustre Douto Delegado João Valentim.

 

Concurso Formal Impróprio 

Art. 70 – Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade.

As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. 

 

Se o crime foi praticado em contextos fáticos distintos, deve-se aplicar a regra do Concurso Material de Crimes, Art. 69, do Código Penal. 

 

Concurso Material

 Art. 69 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela..

 

Quanto ao Crime de Falsidade Ideológica, Art. 299, do Código Penal, acredito que o Douto Delegado tenha entendido que o agressor teria prestado informações, ao se questionado sobre o fato que estava sendo apurado, que foram inseridas em documento público, in casu, autos da investigação, cuja conduta amolda-se ao referido tipo penal. 

 

Falsidade Ideológica

Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.

Parágrafo único – Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.

 

Porteiro do Edifício

Por fim, quanto à conduta do porteiro do edifício em que o fato ocorreu, perfeito o enquadramento no crime de Omissão de Socorro, art. 135, do Código Penal.

O Promotor de Justiça e Professor Rogério Sanches nos comtempla com belíssimo ensinamento sobre o comportamento do porteiro, se teria agido por omissão de socorro ou por crime comissivo por omissão, respondendo pelo crime de lesão corporal na forma omissiva, caso ele estivesse abrangido pela figura do Garante ou Garantidor, nos termos do Art. 13, parágrafo 2º, do Código Penal!

 

Relevância da Omissão

§ 2º – A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; 

b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;

c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

 

Vejam!

 

 

 

Supremo Tribunal Federal Injúria racial é crime imprescritível, decide STF

Veja a belíssima explanação do tema pelo ilustre Promotor de Justiça Rogério Sanches

 

Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe

O Delegado Ronaldo Entringe é um estudioso na área de preparação para Concursos Públicos - Carreiras Policiais, e certamente irá auxiliá-lo em sua jornada até a aprovação, vencendo os percalços que irão surgir nesta cruzada, sobretudo através do planejamento estratégico das matérias mais recorrentes do certame e o acompanhamento personalizado.

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