PROVA DISCURSIVA - Delegado de Polícia - Concurso: PCMA - Ano: 2012 - Banca: FGV - Disciplina: Direito Penal. - Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe
No momento, você está visualizando PROVA DISCURSIVA – Delegado de Polícia – Concurso: PCMA – Ano: 2012 – Banca: FGV – Disciplina: Direito Penal.

PROVA DISCURSIVA – Delegado de Polícia – Concurso: PCMA – Ano: 2012 – Banca: FGV – Disciplina: Direito Penal.

Delegado de Polícia – Concurso: PCMA – Ano: 2012 – Banca: FGV – Disciplina: Direito Penal.

 

Paula, jovem primária e de bons antecedentes, excursionava pela cidade de Buenos Aires e lá vem a conhecer João, também brasileiro, que residia na Argentina há vários anos.

Paula e João iniciaram um romance, tendo este oferecido à quantia de R$ 1.000,00 para que aquela levasse farta quantidade de lança perfume para o Brasil, ambos tendo conhecimento de que aquele material é considerado entorpecente no país destinatário, apesar de ser lícita a sua comercialização no país de origem.

Paula aceita colaborar eventualmente com João e vem de ônibus para o Maranhão, destino final da droga.

Por seu turno, João vem de avião, com parada no Rio de Janeiro, onde recebe de pessoa desconhecida certa quantidade de cocaína para ser comercializada.

Paula tinha conhecimento que João receberia a cocaína antes de chegar a cidade de São Luiz e que levaria aquela droga para o destino final, não tendo, porém, qualquer vínculo com o novo namorado no tocante a tal entorpecente.

Próximo à rodoviária de São Luiz, o ônibus utilizado por Paula é parado pela Polícia Federal e o material é encontrado no interior da mala que estava no bagageiro próprio de lado de diversas forma, sendo Paula detida, ocasião em que admitiu o ilícito, disse que pela primeira vez agira daquela forma, o que fez porque precisava de dinheiro para garantir o sustento do filho, e apontou João como sendo o dono do material, inclusive indicando o local no qual ele poderia ser encontrado e que ele estaria com cocaína em seu poder.

Os policiais prosseguiram na diligência e detiveram João no quarto do hotel em que estava hospedado, sendo lá apreendida farta quantidade de cocaína que também se destinava a ilícita comercialização, bem como uma arma com numeração raspada, certo que esta se encontrava no interior da sacola juntamente com o entorpecente.

A partir da hipótese sugerida, responda aos itens a seguir:

1- Apresente a devida tipificação com a fundamentação necessária.

2- Indique a justiça competente e eventual presença de causas de aumento ou de diminuição de pena porventura incidente.

3- Apresente qualquer circunstância relevante na dosimetria penal.

4- Analise a legalidade da diligência realizada no quarto do hotel de João, eis que os policiais lá ingressaram sem mandado judicial e sem o consentimento do legítimo ocupante.

RESPOSTAS ÀS QUESTÕES DA PROVA

 

1- Apresente a devida tipificação com a fundamentação necessária.

 

Pela conduta de PAULA, deverá responder como incurso nas penas do Art. 33, caput, da Lei de Drogas com possibilidade de ser lhe aplicada uma causa de diminuição de pena, nos termos do parágrafo 4º do Art. 33 da Lei de Drogas.

Ainda, em relação à PAULA, sua conduta não se amolda ao tipo penal do Art. 35, da Lei de Drogas, visto que um dos requisitos para esse crime é o dolo em associar-se modo estável e permanente. A questão da prova nos informa que PAULA manifestou em colaborar com JOÃO de modo  eventual, constituindo, portanto, mero CONCURSO DE PESSOAS.

 

“Paula aceita colaborar eventualmente com João e vem de ônibus para o Maranhão, destino final da droga.”

 

Discute-se se em relação à conduta de PAULA haveria a incidência da causa de aumento de pena prevista no Art. 40, inciso III, da Lei de Drogas.

 

Art. 40. As penas previstas nos artigos. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:

I – a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito;

II – o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância;

III – a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;

IV – o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva;

V – caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal;

VI – sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação;

VII – o agente financiar ou custear a prática do crime.

 

Quanto a esse tema, há divergência jurisprudencial, porquanto para alguns somente incide a majorante quando o tráfico, ou seja, a venda de drogas ocorre no interior do coletivo, enquanto os outros interpretam a norma de forma objetiva, pouco importando que a droga esteja no maleiro do ônibus. Prevaleceu na 2ª Turma do STF o primeiro entendimento em voto capitaneado por Rosa Weber, ficando vencido Fux.

Trazemos à baila comentário extraído do site Dizer o Direito, in verbis:

 

O art. 40, III, da Lei de Drogas prevê como causa de aumento de pena o fato de a infração ser cometida em transportes públicos.

Se o agente leva a droga em transporte público, mas não a comercializa dentro do meio de transporte, incidirá essa majorante?

NÃO. A majorante do art. 40, II, da Lei n.° 11.343/2006 somente deve ser aplicada nos casos em que ficar demonstrada a comercialização efetiva da droga em seu interior. É a posição majoritária no STF e STJ.

STF. 1ª Turma. HC 122258-MS, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 19/08/2014.STF. 2ª Turma. HC 120624/MS, Red. p/ o acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 3/6/2014 (Info 749).STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.295.786-MS, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 18/6/2014 (Info 543). STJ. 6ª Turma. REsp 1443214-MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/09/2014.

 

 

Art. 33, da Lei de Drogas: Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos , desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. 

 

Em relação ao § 4º do Art. 33 da Lei n. 11.343/06 – TRÁFICO PRIVILIGIADO, faz jus PAULA a essa causa de diminuição de pena?

Segundo a tema de acordo com a doutrina e a jurisprudência, somente faz jus, além dos requisitos constantes da norma, que o réu tenha agido de forma ocasional e episódica.

04(quatro) são os requisitos: 

a) primário, ou seja, não é reincidente

b) bons antecedentes, isto é, ausência de antecedentes criminais, devendo o leitor atentar para a Súmula 444, do STJ, in  verbis:

“É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.”

c) não se dedique às atividades criminosas, não fazendo do crime um meio de vida, ou seja, não agindo com habitualidade.

O STJ possui o entendimento de que se o réu já condenado por “associação criminosa”, não faz jus ao benefício.

d) não integre organização criminosa. 

Questão controversa diz respeito à conduta das pessoas que se fazem passar por “mulas” para fazer o transporte de drogas.

 

Para o STF, “mulas”fazem parte de organização criminosa, não podendo se beneficiar com a causa de diminuição de pena.

HC 123430Órgão julgador: Primeira Turma Relator(a): Min. LUIZ FUX Julgamento: 14/10/2014 Publicação: 18/11/2014

 

Por sua vez, a doutrina sustenta o entendimento de que  mulas são prestadoras de serviços remunerados para organização criminosa, não fazendo parte desta.

 

2- Indique a justiça competente e eventual presença de causas de aumento ou de diminuição de pena porventura incidente.

 

Em relação à segunda pergunta da questão da prova, temos que se trata competência estadual, juízo criminal da comarca de São Luiz, Maranhão. 

Não se trata de competência da justiça federal, porquanto o “Lança Perfume” não é considerada entorpecente na Argentina, afastando o tráfico internacional de drogas. 

COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. CC 34514 / PR
CONFLITO DE COMPETENCIA 2002/0014395-7

O “cloreto de etila”, vulgarmente conhecido como lança-perfume, continua sendo substância proibida pela Lei de Tóxicos.

Sendo, o lança-perfume de fabricação Argentina onde não há proibição de uso e não constando, o “cloreto de etila”, das listas anexas da Convenção firmada entre o Brasil e a Argentina  não se configura a internacionalidade do delito, mas, tão-somente, a violação à ordem jurídica interna brasileira.

Caracterizado, em tese, apenas o tráfico interno de entorpecentes, sem qualquer cumulação de crimes, eis que não foi apreendido nenhum outro tipo de mercadoria com o indiciado, sobressai a competência da Justiça Estadual para o processo e julgamento do feito.

 

Em relação à conduta de JOÃO, deverá responder pelos seguintes crimes:

 

Art. 33, caput, da Lei de Drogas quanto ao entorpecente “lança-perfume” apreendido em poder de PAULA, pois utilizou-se desta para o transporte da referida droga, sendo de sua propriedade como a mesma afirmou. 

Também deverá responder pelo crime do Art. 33, caput, da Lei de Drogas em relação à “cocaína” encontrada em seu poder no quarto de hotel, com incidência de causa de aumento de pena prevista no Art. 40, inciso V, da Lei de Drogas.

Da mesma forma, quanto à arma de fogo, com numeração raspada, apreendida em seu poder no quarto de hotel, cuja conduta amolda-se ao tipo penal do Art. 16, parágrafo 1º, inciso IV, da Lei de Armas. 

Ainda, em relação à arma de fogo, diverge a doutrina se há incidência de causa de aumento de pena em concurso com o crime de porte de arma de fogo. 

Primeira Corrente sustenta o entendimento de haver concurso de crimes, despiciendo invocar bis in idem, porquanto tutela-se bem jurídicos diversos .

Segunda Corrente adota o entendimento de que eventual concurso de crimes caracteriza bis in idem, pois estaria sendo valorado o porte de arma de fogo mais de uma vez, ora para majorar a pena no crime de tráfico de drogas ora para tipificar o crime de porte de arma de fogo. 

Ressalta-se, no entanto, seja qual for o entendimento adotado,  necessário se faz perquirir se a arma de fogo está sendo utilizada para assegurar a consecução do tráfico de drogas. Por exemplo, no local da traficância é vigiado por grupos armados, o que não se infere na questão da prova, motivo pelo qual não haverá a incidência da causa de aumento de pena, prevista no Art. 40, inciso IV, da Lei de Drogas.

 

No que diz respeito à legalidade da diligência realizada no quarto do hotel de João, porquanto os policiais lá ingressaram sem mandado judicial e sem o consentimento do legítimo ocupante, a remansosa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no entendimento de que, in verbis:

 

HC 732442 / SP HABEAS CORPUS 2022/0090724-9 – DJe 21.10.2022 

1. Consoante entendimento desta Corte, “nos crimes permanentes, tal como o tráfico de drogas, o estado de flagrância se protrai no tempo, o que, todavia, não é suficiente, por si só, para justificar busca domiciliar desprovida de mandado judicial, exigindo-se a demonstração de indícios mínimos de que, naquele momento, dentro da residência, está diante de situação de flagrante delito” (RHC 134.894/GO, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 02/02/2021, DJe 08/02/2021.)

2. As instâncias ordinárias concluíram que os agentes públicos tinham fundadas suspeitas da prática de crime na casa do acusado, tendo em vista que o paciente fora “abordado por policiais militares, após estes receberem a notícia por populares de que uma pessoa com suas características estava realizando o transporte de drogas, com ele foram apreendidas duas porções de maconha e, ainda, cinco munições de calibre .38 SPL, além da quantia de RS 500,00 (quinhentos reais) em dinheiro”.

3. Não foram realizadas investigações prévias nem indicados elementos concretos que confirmassem o crime de tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo e receptação dentro da residência, não sendo suficiente, por si só, a verificação de atitude suspeita do paciente, seu nervosismo ou mesmo seu comportamento no momento da abordagem, tampouco a apreensão de certa quantidade de droga em sua posse e/ou de munições.

4. As drogas, munições e objetos receptados apreendidos na residência devem ser consideradas como fruto de prova ilegal, haja vista a invasão de domicílio, assim como a arma e munições apreendidas no terreno baldio (imóvel com aparência de abandonado), tendo em vista que as informações foram obtidas em clima de completa ausência de voluntariedade durante a constrição efetuada na residência.

 

Isso é tudo, pessoal!

Bons Estudos!

Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe

O Delegado Ronaldo Entringe é um estudioso na área de preparação para Concursos Públicos - Carreiras Policiais, e certamente irá auxiliá-lo em sua jornada até a aprovação, vencendo os percalços que irão surgir nesta cruzada, sobretudo através do planejamento estratégico das matérias mais recorrentes do certame e o acompanhamento personalizado.

Deixe um comentário