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Informativo n.º 814, do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Independentemente da orientação sexual da vítima, o delito de injúria se caracteriza pela utilização de insultos preconceituosos e homofóbicos que ofendem a honra subjetiva do ofendido.
Fundamento Jurídico da Decisão Acima
No caso, a vítima gravou as ofensas no interior da sua casa no momento em que seu vizinho de casa contígua proferia diversos xingamentos contra ele e a companheira.
A gravação realizada pela vítima sem o conhecimento do autor do delito não se equipara à interceptação telefônica, sendo prova válida.
Caso em que a vítima, dentro de sua própria residência, gravou as ofensas homofóbicas proferidas pelo vizinho a ela direcionadas.
Independentemente da real orientação sexual da vítima, o delito de injúria restou caracterizado quando o acusado, valendo-se de insultos indiscutivelmente preconceituosos e homofóbicos, ofendeu a honra subjetiva do ofendido, seu vizinho.
Isto é, não é porque a vítima é heterossexual que não pode sofrer homofobia (injúria racial equiparada) quando seu agressor, acreditando que a vítima seja homossexual, profere ofensas valendo-se de termos pejorativos atrelados de forma criminosa a esse grupo minoritário e estigmatizado.
Em síntese, trata-se de ofensa preconceituosa de teor racista perpetrada contra a vítima heterossexual, mas que o ofensor acreditava ser ele homosexual.
A decisão acima ressalta que independe da orientação sexual da vítima para configurar o crime de injúria racial.
As ofensas preconceituosas foram direcionadas para homem heterossexual.
Há alguma ilegalidade na gravação pela vítima das ofensas contra contra si perpetradas pelo ofensor?
“No caso, a vítima gravou as ofensas no interior da sua casa no momento em que seu vizinho de casa contígua proferia diversos xingamentos contra ele e a companheira.”
Definitivamente, Não.
Inicialmente, in verbis:
É clássica, nesse sentido, a lição de Alexandre de Moraes:
“as liberdades públicas não podem ser utilizadas como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito.
Dessa forma, aqueles que, ao praticarem atos ilícitos, inobservarem as liberdades públicas de terceiras pessoas e da própria sociedade, desrespeitando a própria dignidade da pessoa humana, não poderão invocar, posteriormente, a ilicitude de determinadas provas para afastar suas responsabilidades civil e criminal perante o Estado”.
(Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 382-383)
Entendo que não há crime perpetrado pela vítima quando deu início as gravações em vídeo diante das ofensas perpetrada contra si de teor racistas.
Infere-se que o ofensor, de sua casa, proferiu palavras injuriosas de teor racistas, insultando a vítima de forma preconceituosa e homofóbica.
Além do mais, a gravação foi obtida pela vítima como prova de ilícito penal com nítido intuito de fazer uso em juízo. Foram colhidas pela vítima como meio de defesa diante da investida criminosa pelo ofensor.
Trecho do voto da decisão acima:
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A propósito, a gravação das ofensas foi realizada no interior da casa da vítima no momento em que o agravante – vizinho de casa contígua – proferia diversos xingamentos contra ele e a companheira. Ou seja, a vítima realizou a gravação de dentro de sua própria residência, lugar em que foi possível ouvir os xingamentos do acusado.
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Verifique-se:
1 – Preliminar de ilicitude da prova
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Consoante se depreende da denúncia, há duas residências contíguas, que,
aparentemente, compartilham o mesmo muro.O vídeo ao qual se refere o apelante foi feito do interior da casa da vítima, o Sr. CLAUDIO MARTINS DIOGO.
Conforme consta da ocorrência policial, a vítima chegou a sua casa, por volta das 19h45 e o acusado teria gritado várias vezes “giletão, viadão, a putinha e o giletão, sai do armário giletão”.
Quando a vítima tentou gravar as ofensas, indo de encontro ao muro que divide as casas, o acusado teria dito “grava, grava”.
Não obstante a análise do conteúdo do arquivo seja matéria de mérito, o fato é que, ao se assistir o vídeo, é possível ver que a gravação foi feita do interior de uma residência, que há um muro dividindo as casas (as quais são muito próximas) e que a pessoa que profere os xingamentos o faz com uma voz muito alta, proferindo as ofensas e, no fim, dizendo “grava, grava”.
De saída, é certo que não se pode falar de clandestinidade se o vídeo foi feito do interior da casa da vítima.
Não houve qualquer violação à intimidade, mas apenas a captura do áudio, o qual se podia claramente ouvir de dentro da casa de CLÁUDIO.
Para mais, os Tribunais Superiores entendem que é lícita a gravação de conversas por um dos interlocutores, sem o consentimento do outro, podendo ser validamente utilizado como meio de prova.
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Se gravar uma conversa com a autorização de um dos interlocutores não pode constituir prova ilícita, o que se dirá de gravar um vídeo dentro de sua própria casa.
Jurisprudência abaixo é semelhante ao caso acima, simplesmente por se tratar de uma gravação de vídeo feita pela vítima contra o ofensor, como meio de prova em juízo, tirada do livro de Victor Rios Gonçalves, Direito Processual Penal Esquematizado, in verbis:
a) Filmagem produzida pelo ofendido ou por câmeras de vigilância instaladas em local público ou acessível ao público: possibilidade de utilização, uma vez que só haverá ilicitude da prova dessa natureza quando produzida com violação à privacidade ou intimidade alheia.
A propósito: “Habeas corpus — Filmagem realizada, pela vítima, em sua própria vaga de garagem, situada no edifício em que reside — Gravação de imagens feita com o objetivo de identificar o autor de danos praticados contra o patrimônio da vítima — …
(STF — HC 84.203/RS — 2ª Turma — Rel. Min. Celso de Mello — DJe 25.09.2009).
Renato Brasileiro, in verbis:
11.5. Gravações clandestinas (telefônicas e ambientais)
A gravação clandestina, assim compreendida como aquela feita pelo próprio interlocutor, sem o conhecimento do outro, pode se dar através do registro da conversa telefônica (gravação telefônica) ou da conversa entre presentes (gravação ambiental).
Quanto à (i)licitude da gravação clandestina, é ponto pacífico na doutrina que, por força do princípio da proporcionalidade, a divulgação de gravação sub-reptícia de conversa própria reputa-se lícita quando for usada para comprovar a inocência do acusado, ou quando houver investida criminosa de um dos interlocutores contra o outro.
Assim é que deve ser considerada válida uma gravação clandestina em um crime de extorsão, quando produzida para comprovar a inocência do extorquido.
Não há falar, portanto, em ilicitude da prova que se consubstancia na gravação de conversação telefônica por um dos interlocutores, vítima, sem o conhecimento do outro, agente do crime.
Daí ter concluído o Supremo que é lícita a gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, ou com sua autorização, sem ciência do outro, quando há investida criminosa deste último.
É inconsistente e fere o senso comum falar-se em violação do direito à privacidade quando interlocutor grava diálogo com sequestradores, estelionatários ou qualquer tipo de chantagista.
Afinal de contas, se a linha telefônica está sendo utilizada como instrumento para a prática de crimes, há de se reputar válida a gravação da conversa telefônica pela vítima.
Assistam ao vídeo do ilustre Promotor de Justiça, Rogério Sanches sobre o Tema Gravação Ambiental, in verbis:
Por ora é isso, Pessoal!
Bons Estudos!