Em decisão recente, o Superior Tribunal de Justiça, no mérito, decidiu por tornar inválida, por maioria, diligência de busca e apreensão em residência realizada antes do amanhecer, ou seja, às 05 horas e 25 mim.
Para 6ª Turma do Egrégio Tribunal, o limite de horário trazido pela Lei de Abuso de Autoridade para incursão em residência, das 21h às 5h, não afasta a ilegalidade da incursão em outros horários, prévios ao amanhecer.
A referida diligência foi realizada nos autos do Inquérito Policial da Operação Argentarius, visando apurar os crimes de estelionato, associação criminosa (artigo. 171 e 288 do CP), além do crime de lavagem de dinheiro do art.1º, §1º, I, da lei 9.613/98.
Segundo a Ministra LAURITA VAZ, Relatora, o art. 22, III da lei 13.869/19 – Lei de Abuso de Autoridade, tipifica-se o crime de Abuso de Autoridade realizar cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar no horário entre 21h e 5h, o que significa dizer, implicitamente, que o legislador definiu como dia o período a partir das 5h.
Logo, em seu entendimento, realizar qualquer diligência policial a partir das 5 horas da madrugada não tipifica o crime de abuso de autoridade.
Art. 22, da Lei de Abuso de Autoridade:
Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei:
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo 1º Incorre na mesma pena, na forma prevista no caput deste artigo, quem:
I – coage alguém, mediante violência ou grave ameaça, a franquear-lhe o acesso a imóvel ou suas dependências;
II – (VETADO);
III – cumpre mandado de busca e apreensão domiciliar após as 21h (vinte e uma horas) ou antes das 5h (cinco horas).
Em seu voto de divergência, Ministro Rogerio Schietti, afirmou, em síntese, que é ilegal e sujeita à sanção de nulidade diligência investigativa realizada, mas não tipifica o crime de abuso de autoridade realizado a noite, ainda que fora do horário de 21h as 5h da manhã.
Art. 245, do Código de Processo Penal: As buscas domiciliares serão executadas de dia, salvo se o morador consentir que se realizem à noite, e, antes de penetrarem na casa, os executores mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou a quem o represente, intimando-o, em seguida, a abrir a porta.
Parágrafo 1º: Se a própria autoridade der a busca, declarará previamente sua qualidade e o objeto da diligência.
Parágrafo 2º: Em caso de desobediência, será arrombada a porta e forçada a entrada.
Parágrafo3º: Recalcitrando o morador, será permitido o emprego de força contra coisas existentes no interior da casa, para o descobrimento do que se procura.
Parágrafo 4º: Observar-se-á o disposto nos §§ 2o e 3o, quando ausentes os moradores, devendo, neste caso, ser intimado a assistir à diligência qualquer vizinho, se houver e estiver presente.
Parágrafo 5º: Se é determinada a pessoa ou coisa que se vai procurar, o morador será intimado a mostrá-la.
Parágrafo 6º: Descoberta a pessoa ou coisa que se procura, será imediatamente apreendida e posta sob custódia da autoridade ou de seus agentes.
Parágrafo 7º: Finda a diligência, os executores lavrarão auto circunstanciado, assinando-o com duas testemunhas presenciais, sem prejuízo do disposto no § 4º.
Em resumo, para o eminente Ministro Schietti constitui-se Crime de Abuso de Autoridade realizar diligência policial, a exemplo do cumprimento de mandado de busca e apreensão no horário entre 21 horas e 5 horas da manhã, porém não significa dizer que no horário a partir das 5 horas da madrugada, antes do amanhecer, seja considerada plenamente lícita.
Conceito de Dia
Em sede doutrinária, há divergência quanto ao conceito de dia.
Para a jurisprudência, prevalece o critério físico-astronômico, no sentido de que dia é o período compreendido entre o nascimento (aurora) e o pôr do sol (crepúsculo).
O insigne doutrinador Renato Brasileiro assevera que, in verbis:
Para Alexandre de Moraes (Ministro do Supremo Tribunal Federal, grifo nosso) a aplicação conjunta de ambos os critérios alcança a finalidade constitucional de maior proteção ao domicílio durante a noite, resguardando-se a
possibilidade de invasão domiciliar com autorização judicial, mesmo após as 18:00 horas, desde que, ainda, não seja noite (por exemplo: horário de verão). Adota o Ministro o Critério Astrofísico, grifo nosso.
Ficamos com a posição de José Afonso da Silva, por conferir maior segurança jurídica ao conceito de dia.
Adota o eminente doutrinador , Renato Brasileiro, o Critério Legal, grifo nosso.
Assim, caso a polícia tenha em mãos mandados de busca domiciliar e de prisão, expedidos pela autoridade judiciária competente, só poderá invadir o domicílio durante o dia, mesmo que a casa seja a do próprio indivíduo visado.
Ausente o consentimento para ingressar à noite, resta cercar o local para que, ao alvorecer, seja cumprida a ordem de prisão (CPP, art. 293, caput).
Obviamente, se uma pessoa perseguida em flagrante delito invadir a casa de outrem, sem o seu consentimento, estará praticando outro crime – violação de domicílio (CP, art. 150) –, ou seja, estará em flagrante delito no interior da residência, autorizando, assim, que o agente público possa ingressar na casa e efetuar sua prisão, mesmo que durante a noite.
Operação Argentarius da Polícia Federal
Fonte: Site de Notícias Migalhas
Decisão em PDF – Recurso em Habeas Corpus – Superior Tribunal de Justiça
Fonte Site de Notícias G1 – Operação Argentarius da Polícia Federal