PEÇA PROCESSUAL - MODELO DE DESPACHO DO DELEGADO DE POLÍCIA. - Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe
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PEÇA PROCESSUAL – MODELO DE DESPACHO DO DELEGADO DE POLÍCIA.

Olá, doutores(as)!

MODELO DE DESPACHO de Delegado de Polícia.

Imagine a seguinte situação hipotética:

Em via pública, policiais militares, ao avistarem Tício Oliveira conduzindo sua motocicleta, emitiram ordem de parada. Por estar com sua habilitação vencida, Tício Oliveira desobedeceu a ordem de parada, evadindo-se, cruzando ruas e avenidas da cidade, ultrapassando os semáforos vermelhos, além de conduzir em zig-zag. Após intensa perseguição, Tício Oliveira foi preso e conduzido à Delegacia de Polícia, cujo boletim de ocorrência da polícia militar informa que sua conduta amolda-se ao tipo penal do Art. 309, do Código de Trânsito Brasileiro – Lei n.º 9.507/97. Testemunha e vítimas não foram apresentadas ao Delegado de Polícia. Perante o Delegado, Tício Oliveira confirmou que desobedeceu a ordem de parada emitida pela polícia militar, alegando que estava com sua habilitação vencida.

Art. 309: Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano:

Penas – detenção, de seis meses a um ano, ou multa.

 

Indaga-se: A conduta de Tício Oliveira amolda-se ao tipo penal do Art. 309, do Código de Trânsito Brasileiro? Caso contrário, qual o procedimento que o Delegado de Polícia deve adotar?

DESPACHO

Boletim de Ocorrência Policial n.º 220.345/2020

Doutor RONALDO ENTRINGE, Delegado de Polícia Civil, no uso de suas atribuições constitucionais e legais etc., e com intuito de apresentar conclusão final quanto ao fato investigado, o faz da seguinte forma:

 

CONSIDERANDO o fato constante do boletim de ocorrência policial supra de que o suposto infrator, Tício Oliveira, estaria dirigindo veículo automotor (motocicleta) com habilitação vencida, expondo à incolumidade física de terceiros a perigo de dano, após desobedecer a ordem de parada, vez que teria cruzado ruas e avenidas da cidade, ultrapassando os semáforos vermelhos, além de conduzir em zig-zag, passo a decidir:

 

Primeiramente, Tício não cometeu o crime do Art. 309, do Código de Trânsito Brasileiro, pois era habilitado para dirigir veículo automotor, muito embora sua habilitação estivesse vencida.

 

De fato, o tipo penal abrange àqueles que não possuem habilitação para dirigir veículo automotor ou possuindo, foi cassada! O que não é o caso.

 

In casu, a conduta de Tício amolda-se a infração administrativa do Art. 162, inciso II, do Código de Trânsito Brasileiro, APENAS:

 

Art. 162. Dirigir veículo:

II – com Carteira Nacional de Habilitação, Permissão para Dirigir ou Autorização para Conduzir Ciclomotor cassada ou com suspensão do direito de dirigir:

Infração – gravíssima;

Penalidade – multa (três vezes);

Medida administrativa – recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado;

Em sede jurisprudencial, trazemos à baila o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

DIREITO PENAL. INAPLICABILIDADE DA CAUSA DE AUMENTO DESCRITA NO ART. 302, § 1º, I, DO CTB EM VIRTUDE DE CNH VENCIDA. O fato de o autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor estar com a CNH vencida não justifica a aplicação da causa especial de aumento de pena descrita no § 1º, I, do art. 302 do CTB.

No art. 162 do CTB, o legislador, ao definir diferentes infrações administrativas, distinguiu duas situações: dirigir veículo “sem possuir Carteira Nacional de Habilitação ou Permissão para Dirigir” (inciso I); e dirigir “com validade da Carteira Nacional de Habilitação vencida há mais de trinta dias” (inciso V).

Essas situações, embora igualmente configurem infração de trânsito, foram tratadas separadamente, de forma diversa. Em relação ao crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, o § 1º, I, do art. 302 do CTB determina que a pena será aumentada de 1/3 (um terço) à metade se o agente “não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação”.

Ora, se o legislador quisesse punir de forma mais gravosa o autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor cuja CNH estivesse vencida, teria feito expressa alusão a esta hipótese (assim como fez, no § 1º, I, do art. 302, quanto à situação de “não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação”).

Além disso, no Direito Penal, não se admite a analogia in malam partem, de modo que não se pode inserir no rol das circunstâncias que agravam a pena (art. 302, § 1º) também o fato de o agente cometer homicídio culposo na direção de veículo automotor com carteira de habilitação vencida. HC 226.128-TO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 7/4/2016, DJe 20/4/2016.

Prosseguindo, como Tício não irá responder pelo crime do Art. 309, do Código de Trânsito Brasileiro, resta-lhe a possibilidade de vir a ser autuado como incurso nas penas do Art. 132, do Código Penal – Perigo para a vida ou saúde de outrem, in verbis:

 

Perigo para a vida ou saúde de outrem

Art. 132 – Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:

Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.        Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais.

Segundo a doutrina majoritária, o tipo penal do Art. 132, do Código Penal é de PERIGO CONCRETO, contra PESSOA DETERMINADA.

FERNANDO CAPEZ, in verbis:

 

O perigo deve ser direto, isto é, deve ocorrer em relação a pessoa determinada. Dessa forma, exige-se a prova da existência de perigo concreto contra uma ou determinadas pessoas. Deve também o perigo ser iminente, ou seja, imediato, aquele prestes a se convolar em dano. A possibilidade futura de ocorrência de perigo descaracteriza o delito em tela.

 

In casu, não me foi apresentada pela polícia militar pessoa determinada alguma, isto é, vítima que tenha ficado exposta a situação de perigo atual a sua incolumidade física.

Falta, portanto, a elementar do tipo penal: “colocar em perigo a vida ou a saúde de outrem.”.

Entendo tratar-se de FATO ATÍPICO.

Por último, resta apreciar e decidir sobre a ocorrência ou não do CRIME de DESOBEDIÊNCIA – Art. 330, do Código Penal.

 

 

Art. 330, do Código Penal: Desobedecer a ordem legal de funcionário público:

Pena — detenção, de quinze dias a seis meses, e multa”.

 

Em seu depoimento informal, em sede policial, Tício Oliveira confessou que desobedeceu ordem de parada dos policiais militares quando solicitado.

Nesse ponto, entendo que a conduta de Tício amolda-se ao tipo penal do Art. 330, do Código Penal.

Autue-se Tício como incurso nas penas do Art. 330, do Código Penal.

Lavra-se Termo Circunstanciado de Ocorrência, por se tratar de crime de menor potencial ofensivo, cuja penal máxima não ultrapassa dois anos.

É o meu despacho. Cumpra-se.

Professor & Coach Delegado Ronaldo Entringe

O Delegado Ronaldo Entringe é um estudioso na área de preparação para Concursos Públicos - Carreiras Policiais, e certamente irá auxiliá-lo em sua jornada até a aprovação, vencendo os percalços que irão surgir nesta cruzada, sobretudo através do planejamento estratégico das matérias mais recorrentes do certame e o acompanhamento personalizado.