TRF/2ª REGIÃO/PROVA/2007– MAGISTRATURA FEDERAL – TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS – LEI N.º 11.343/2006.
Caius, a pedido de Aurelius, que está com a mão engessada, enrola um cigarro de maconha, e ainda cede o papel empregado para tanto, para que apenas Aurelius possa usar a droga que trazia consigo. De outro lado, Tícius, após receber a pasta de cocaína – bruta – em seu galpão, efetua as misturas necessárias para disponibilizá-la ao uso.
INDAGA-SE: Quais os critérios distintivos das condutas de Caius e Tícius e o que elas constituem?
A conduta de Caius amolda-se ao tipo penal do parágrafo 2º, do art. 33, da Lei de Drogas, na medida em que prestou auxílio material à Aurelius para o uso indevido de drogas.
Art. 33, Parágrafo 2º: Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga:
Pena — detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa.
Segundo se infere do texto da prova, o auxílio material consistiu na montagem do cigarro de maconha, considerando que Aurelius estava com a mão engessada, incapacitado, portanto, de fazer uso por si próprio, motivo pelo qual solicitou auxílio. Não se olvide que o auxílio material consistiu, também, no fornecimento de papel para formar o cigarro de maconha.
Por outro lado, a conduta de Tícius adequa-se ao tipo penal do Art. 33, parágrafo 1º, da Lei Drogas, como sendo Tráfico de Matéria Prima, Insumos ou Produtos Químicos destinados à preparação de drogas, ou seja, recebeu pasta-base de cocaína, procedendo, em seguida, a produção de drogas, mediante misturas, para venda à usuários.
Por último, como a produção da droga ocorreu no galpão de Tícius, poder-se-ia enquadrar, também, a conduta de Tícius no tipo penal do art. 33, parágrafo 1º, inciso III, da Lei de Drogas, in verbis.
Art. 33, Parágrafo 1º, inciso III — utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.
Lego engano!!!
Como o recebimento da pasta de cocaína em seu galpão (local) ocorreu em um mesmo contexto fático, não será possível adequar sua conduta, também, ao tipo penal em comento, com fundamento no Art. 69, do Código Penal – CONCURSO MATERIAL, mas apenas como PROGRESSÃO CRIMINOSA, na vertente post factum impunível.
Segundo a remansosa doutrina, PROGRESSÃO CRIMINOSA, espécie de CONSUNÇÃO, possui 03(três) subespécies:
- Progressão Criminosa em Sentido Estrito;
- Fato anterior (“ante factum”) não punível:
- Fato posterior (“post factum”) não punível
Segundo o ilustre doutrinador, FERNANDO CAPEZ, in verbis:
Conceito de CONSUNÇÃO: é o princípio segundo o qual um fato mais amplo e mais grave consome, isto é, absorve, outros fatos menos amplos e graves, que funcionam como fase normal de preparação ou execução ou como mero exaurimento. Costuma-se dizer: “o peixão (fato mais abrangente) engole os peixinhos (fatos que integram aquele como sua parte).
…
Fato posterior (“post factum”) não punível: ocorre quando, após realizada a conduta, o agente pratica novo ataque contra o mesmo bem jurídico, visando apenas tirar proveito da prática anterior. O fato posterior é tomado como mero exaurimento. Exemplo: após o furto, o agente vende ou destrói a coisa.
Obs.: há uma regra que auxilia na aplicação do PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO, segundo a qual, quando os crimes são cometidos no mesmo contexto fático, opera-se a absorção do menos grave pelo de maior gravidade.
Sendo destacados os momentos, responderá o agente por todos os crimes em concurso. Assim, por exemplo, se o sujeito é agredido em um boteco e, jurando vingança, dirige-se ao seu domicílio ali nas proximidades, arma-se e retorna ao local, logo em seguida, para matar seu algoz, não responderá pelo porte ilegal e disparo da arma de fogo em concurso com o homicídio doloso, já que tudo se passou na mesma cena, em um mero desdobramento de ações até o resultado final.
Neste caso, o porte e o disparo integram o homicídio como parte de seu iter criminis, de maneira que puni-los autonomamente implicaria bis in idem inaceitável, pois já foram punidos como partes de um todo (a ação homicida).
Ao contrário, se um larápio perambula a noite inteira com um revólver pelas ruas, até que, ao nascer do sol, encontra uma desafortunada vítima, a qual vem a assaltar, haverá concurso de crimes entre o porte ilegal e o roubo, dada a diversidade dos momentos consumativos e dos contextos em que os delitos foram cometidos.
Por fim, respondendo a última pergunta da prova, temos que a conduta de Caius, por não haver propósito econômico ou comercial, não é caracterizada como sendo “tráfico de drogas”, motivo pelo qual não estará sujeitos aos gravames do Art. 44, da Lei de Drogas.
Nesse sentido FERNANDO CAPEZ, in verbis:
Mencione-se que por não constituir figura equiparada ao tráfico ilícito de drogas, o mencionado crime não se sujeita ao tratamento mais gravoso da Lei dos Crimes Hediondos. Da mesma forma, não se aplica o art. 44 da Lei de Drogas. Também não se exigirá o cumprimento de 2/3 da pena para a concessão do livramento condicional (art. 44, parágrafo único).
Finalmente, não se aplicará o disposto no art. 59, que veda o direito de apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes. Sobre o tema, vide comentários ao caput do art. 33.
Por outro lado, a conduta de Tícius, por visar a produção e venda de drogas, está enquadrada como tráfico de drogas, sujeitando às restrições previstas no Art. 44, da Lei de Drogas e na Lei de Crimes Hediondos.
Art. 44, da Lei de Drogas: Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.
Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico.